terça-feira, 19 de janeiro de 2016

~ Dependência química: algumas considerações

            Diante a cultura das drogas, penso que além dessa não ser recente, cria um aspecto de normatização quanto ao uso e abuso dessas substâncias. Ocorre uma reprodução das normas, valores, leis e comportamentos que são transmitidos de uma geração a outra. Entretanto, a temática das drogas nunca foi tão discutida como é na atualidade, até mesmo pela facilidade dos meios de comunicação. Nessa reprodução de comportamentos sociais, o uso de drogas, especialmente álcool e tabaco passam a ser incorporados e normalizados pelo indivíduo, já que nasceu e desenvolveu-se num ambiente que abordou o uso como natural. Logo, parece fazer parte da vida do jovem, que, nas primeiras festas, primeiras saídas como adolescente faz o uso de substâncias por encontrar-se agora numa fase do desenvolvimento no qual lhe é cobrado maturidade, responsabilidade e ações que comprove, que ele é adulto. O uso de álcool, por exemplo, vem atrelado ao pensamento interno, reforçado e reproduzido no social no qual adultos bebem, ou como a mídia anuncia "a partir dos 18 anos". Embora na nossa realidade sabemos que o uso de substâncias já inicie muito antes dessa idade, o jovem busca uma aprovação social para tornar-se adulto, num meio ainda de crise e acomodação de uma identidade.
            Tendo isso como um espiral que se desenvolve entre gerações, a cultura das drogas, e o ato de beber, passa a ser uma representação social daquilo que é ser adulto. Com certeza, uma imagem deturpada e distorcida do real significado do amadurecimento.
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            Quanto à questão do estigma ao dependente químico, penso que este vem do ser humano, que também é educado e vive em uma sociedade que constrói e reforça tais estigmas. Percebo que os estereótipos ocorrem em diferentes populações, além do que sigam da droga e do usuário dela. Fomos educados nesse propósito de marginalizar o diferente, de apontar a diferença. Logo, também é justificável que as pessoas compreendam com seus pensamentos e suposições sobre temas e sobre o outro. Nesse sentido, uma possibilidade de intervenção seria voltará a capacitação e aproximação com a temática de forma a que a partir de maior conhecimento, a compreensão sobre a dependência química ocupe maior potencial na reformulação desses estereótipos. 
            Além disso, os profissionais envolvidos no trabalho com pessoas devem buscar formas de treinarem-se não somente na fonte do conhecimento, mas também da aceitação do outro a partir da sua história, cultura e vivências, ‘ser humano’. Esses elementos, quando levamos em consideração aprimoram o trabalho das pessoas que lidam com a saúde. Na psicologia, um possível trabalho poderia ser voltado ao desenvolvimento de qualidades como empatia e escuta ativa tanto do usuário como de suas famílias e da comunidade. Essas qualidades, quanto melhor desenvolvidas, auxiliam ao profissional da saúde a fortalecer um vínculo com quem busca ajuda, repercutindo na melhora da autoestima e viabilizando a quebra no circuito de estigma interno de que o dependente químico possa ter de si. Ele passa a perceber que é aceito por que, ele é e não somente pela característica da droga, dos efeitos e do prejuízo que tem do uso ou abuso.
            Penso que nessas configurações, o movimento de mudança frente a estigmas e esteriótipos é uma via de mão dupla (ou várias mãos) pois vai depender de muitos fatores, como por exemplo o que cito e explico acima.
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            Cada região do Brasil apresenta variações quanto ao tipo de droga mais utilizada. Por isso deve-se fazer um levantamento local onde pretende-se investigar os dados epidemiológicos. Entretanto, penso que as drogas com maios prevalência são o álcool e o tabaco, não somente por serem drogas lícitas, mas também por serem facilmente adquiridas.
            Na minha experiência profissional na área da saúde, trabalhando com crianças e adolescentes em ambientes escolares, há muita ocorrência do uso e disseminação dessas drogas. Ao menos relatam ter usado uma vez na vida, tanto o álcool como o tabaco, sendo que a maioria faz uso abusivo quando longe da família, num período de uma vez ao mês. Além disso, relatam o uso da maconha em terceiro lugar, quando não já utilizada, relatam curiosidade, e interesse em experimentar. Essa maior prevalência vem no discurso de meninos, sendo que as meninas têm maior receio e até repudio contra maconha, atendo o interesse principalmente no álcool.
            Podendo perceber essas situações se torna importante o trabalho com essas populações, a fim de trazer informações a respeito das drogas e construir intervenções para diminuir a prevalência. 
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            Como forma de intervenção, a intervenção breve (IB) é sim eficaz, não somente na dependência química, mas em qualquer contexto de saúde, na promoção e prevenção e até atenuação.
            No meu contexto de atuação utilizo a intervenção breve, especialmente em casos que não poderão dar continuidade ao tratamento. Orientação, empatia, busca por informações, clarificação da situação em que o indivíduo se encontra são sempre importantes de serem mencionados, especialmente para motivar que este retorne ao serviço, ou que reflita sobre as questões que acompanham sua vida e quais fatores estão interligados com os comportamentos compulsivos ou aditivos, bem como de que maneira isso respinga ou reflete na vida dele e dos que os rodeiam.
            Devido a autonomia do trabalho do psicólogo, essa técnica não apresenta limitações, pelo contrário, fortalece e favorece que o serviço se mantenha, qualifica o contexto de trabalho como um local aberto e passível de auxílio.

~ Considerações feitas a partir do Curso SUPERA - Sistema para detecção do uso abusivo e dependência de substâncias psicoativas: encaminhamento, intervenção breve, reinserção social e acompanhamento. Minhas publicações nos fóruns de discussão, frente a leitura e apreensão de novos aprendizados da temática da dependência química.

Atenciosamente, 
Rafaela Fava de Quevedo
Psicóloga

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